“Temos que nos forçar a andar, falar e vestir conforme manda a sociedade, simplesmente para não sermos espancadas por quem quer que esteja de mau humor no dia em questão.
Temos que sacrificar todo o nosso ser. Não estou tentando provocá-los, simplesmente é quem eu sou.”
~ Maria, mulher trans libanesa
Da ONU: A 74ª sessão da Assembleia Geral da ONU terminou em 30 de setembro, após uma semana de reuniões de alto nível, discursos e debates. Durante a semana, líderes do mundo inteiro participaram da primeira cúpula sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) desde sua adoção, em 2015. A vice-secretária-geral da ONU, Amina Mohammed, enfatizou que os Estados-membros deverão “apurar o passo”:
“Em suma, ainda não estamos alcançando as metas.”
O UNAIDS elogiou a adoção de uma declaração política reafirmando o compromisso com os ODS e a promessa de “não deixar ninguém para trás”. Como parte dessa promessa, todos os 17 objetivos interligados para ter um “planeta mais saudável e um mundo mais justo” deverão ser inclusivos das pessoas independente de orientação sexual, identidade de gênero ou expressão de gênero. O Banco Mundial e o PNUD vêm trabalhando 65 tópicos com a sociedade civil e especialistas para desenvolver um “índice de inclusão LGBTI”, que proporcionará indicadores específicos que poderão ser utilizados para medir o progresso rumo ao alcance dos ODS. Para informações adicionais, confira o relatório “PARA TODOS: os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e as Pessoas LGBTI”, da Federação Sueca pelos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Pessoas Queer (RSFL).
Os Estado-membros também adotaram uma declaração política sobre a Cobertura Universal da Saúde, que reafirma que todo ser humano, “sem distinção de qualquer natureza”, tem direito ao mais alto nível alcançável de saúde física e mental. Entre as promessas contidas na declaração, há compromissos específicos com o fim da epidemia da AIDS, a eliminação do estigma e da discriminação em serviços de saúde, e a garantia do acesso universal a serviços de saúde sexual e reprodutiva. Muitos ativistas e grupos da sociedade civil expressaram preocupações que a declaração não deixe explícito quais “serviços essenciais” seriam incluídos. Temem que as necessidades das populações vulneráveis possam ser esquecidas. Reiterando essas preocupações, Jean Claude Mugunga explicou por que limitar serviços de atenção à saúde fragiliza a declaração de que a saúde é um direito humano.
O UNAIDS parabenizou os compromissos e pediu que os Estados-membros “alcançassem grupos particularmente atingidos pelo HIV, incluindo profissionais do sexo, gays e outros homens que fazem sexo com homens, pessoas trans, pessoas que injetam drogas, pessoas privadas de liberdade e pessoas em contextos de conflitos, a fim de garantir que mesmo as pessoas mais marginalizadas sejam alcançadas pelos serviços de saúde”.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, apresentou à Assembleia Geral um relatório sobre a situação dos direitos humanos no Irã. O relatório incluiu uma seção especificamente sobre os direitos das pessoas LGBTI+, observando que as relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo são criminalizadas com a pena de morte. Também afirma que a redação ampla e vaga do Código Penal é utilizada pelas autoridades para punir expressões arbitrárias de gênero e sexualidade com prisão, chibatadas e multas.
HIV saúde e bem-estar: o The Lancet HIV publicou uma revisão e meta-análise inédita que mostrou que o HIV continua atingindo desproporcionalmente gays, bissexuais masculinos e outros homens que fazem sexo com homens, em toda a África. Os autores avaliaram 75 estudos independentes, realizados em 28 países. Observaram que a conscientização quanto ao HIV, a cobertura do TARV e a supressão viral permanecem baixas demais para poder alcançar as metas 90-90-90 do UNAIDS até 2020. Além disso, os níveis de testagem estavam significativamente mais baixos nos países com legislação severa contra LGBTI+ quando comparado aos demais países.
Nas Filipinas, o Cadastro de HIV/AIDS & TARV anunciou que há mais de mil novos casos confirmados de HIV no país. Os dados mostram que 80% dos novos casos ocorreram entre jovens e que 95% dos novos casos eram masculinos. Quase todos os casos (98%) foram transmitidos sexualmente, com 85% entre gays, bissexuais masculinos ou outros homens que fazem sexo com homens.
O Journal of the International AIDS Society publicou um estudo inédito investigando o uso de PrEP e comportamentos de risco entre homens trans que fazem sexo com homens cisgênero. Os autores observaram que estudos anteriores tiveram enfoque em mulheres trans e que atualmente os homens trans são excluídos dos ensaios biomédicos com PrEP. Foram entrevistadas 857 pessoas com o sexo feminino atribuído ao nascerem e que atualmente se identificam como estando no espectro transmasculino (incluindo masculino/homem trans, não binário, e gay), 55% relataram fatores de risco elevado que indicaram maior necessidade do uso da PrEP.
A Food and Drug Administration (FDA) dos EUA aprovou um novo medicamento para a prevenção do HIV: o “descovy”. Ele foi aprovado somente para homens cisgênero e mulheres trans, visto que não foi testado em mulheres cisgênero e nem em homens trans. O New York Times noticiou que a FDA está exigindo que a fabricante Gilead faça estudos com o medicamento entre mulheres cisgênero. A falta de diversidade nos ensaios biomédicos com medicamentos para HIV foi tópico de discussão, em julho deste ano, na 10ª Conferência Científica sobre HIV da International AIDS Society (IAS 2019).
A tabela de preços para o Truvada e para o Descovy foi fixada em 1.758,00 dólares por mês para as pessoas que moram nos Estados Unidos, segundo reportagem da Reuters. A organização Prep4All Collaboration, sediada nos EUA, observou que a fabricação do truvada tem custo de 6,00 dólares por mês, e que o preço está inflado em mais de 25.000%. A campanha realizada pela organização, chamada “Vamos Quebrar o Patente”, visa a disponibilização da PrEP a preços acessíveis e ampliará seu objetivo de acabar com as patentes do Truvada e do Descovy, o mais brevemente possível.
Já no Reino Unido, a BBC noticiou que pelo menos 15 pessoas na Inglaterra tiveram resultado positivo para o HIV enquanto esperavam para fazer parte do ensaio Impact PrEP. A demanda pela PrEP excedeu as vagas para participantes no ensaio. As pessoas que não conseguiram ser incluídas no ensaio podem comprar a PrEP por conta própria, por cerca de 30 euros por mês, segundo reportagem da BBC. Yusef Azad, da National AIDS Trust, chamou a morosa disponibilização da PrEP fora do ensaio de “violação dos direitos humanos”.
O CDC europeu divulgou que, em 23 países da Europa, o custo da PrEP varia entre 850,00 e 3,25 euros por mês. Na Polônia, especialistas em HIV, ativistas, representantes de empresas farmacêuticas e médicos se reuniram na cúpula “PrEP na Europa” para discutir sobre como construir “uma abordagem mais unida e igualitária à disponibilização da PrEP dentro da região europeia da OMS”.
O CDC dos Estados Unidos noticiou que os casos de gonorreia, clamídia e sífilis alcançaram um nível recorde, com quase 2,46 milhões de novas infecções em 2018. O CDC alertou que é provável que o verdadeiro número de novos casos seja muito mais alto, porque muitas ISTs deixam de ser diagnosticadas e não são notificadas às autoridades sanitárias.
Um estudo da Austrália, publicado na revista Archives of Sexual Behavior, observou que gays e bissexuais masculinos não brancos que utilizam o aplicativo de relacionamento Grindr, muitas vezes, enfrentam o “racismo sexual”—quando os parceiros em potencial são rejeitados devido à sua raça. A autoestima e a satisfação com a vida desses homens também estão significativamente mais baixos. Um estudo canadense publicado na Body Image revelou que o Grindr tem impacto negativo na percepção que seus usuários gays e bissexuais têm dos próprios corpos. Os autores também identificaram três temas no aplicativo de relacionamento que impactaram a imagem corporal: estigma em relação ao peso, objetificação sexual e comparação social.
Mais sobre HIV, saúde e bem-estar
Do mundo da política: A Global Equality Caucus—uma rede internacional de parlamentares e representantes eleitos voltada para o enfrentamento da discriminação contra as pessoas LGBTI+—realizou uma série de reuniões, em Tóquio, para facilitar o diálogo entre líderes regionais e políticos com enfoque nas necessidades das pessoas LGBTI+ na Ásia-Pacífico. O presidente da Caucus, o parlamentar do Reino Unido Nick Herbert, também se reuniu com os legisladores japoneses Masako Mori e Keiji Furuya para compartilhar estratégias para a legalização do casamento igualitário sem deixar de ser sensível aos valores conservadores e à liberdade religiosa.
Em Uganda, a Reuters citou o ministro de Ética e Integridade, Simon Lokodo, que afirmou que alguns deputados estão dispostos a reapresentar o projeto de lei de proibição da homossexualidade, de 2014. No entanto, o porta-voz do governo, Ofwono Opondo, reagiu à notícia dizendo que o governo "não pretende apresentar qualquer novo projeto de lei para regular as atividades LGBTI+". Também em Uganda, o assassinato recente de um jovem operador do direito levou o grupo Sexual Minorities Uganda a divulgar uma nota pedindo que o governo condene a violência contra as pessoas LGBTI+.
Na França, a Câmara Baixa do Parlamento votou pela aprovação de um projeto de lei sobre bioética que permitiria que as lésbicas e mulheres solteiras pudessem se submeter à reprodução medicamente assistida. Agora, o projeto de lei passa para a aprovação da Câmara Alta. Cerca de 42 mil pessoas fizeram uma passeata contra a lei, a qual vem provocando controvérsia, há meses, entre grupos conservadores e católicos. A lei não alteraria a proibição da maternidade de substituição—deixando para trás os casais gays e outros casais impossibilitados de gerar filhos. Em matéria no Atlantic, Rachel Donadio explica os vínculos culturais e históricos que fazem com que questões de parentalidade, patrimônio, reprodução e herança dividem a nação.
Na Polônia, a Sejm (Câmara Baixa do Parlamento) está se preparando para votar uma emenda ao código penal, apresentada por iniciativa popular, que efetivamente criminalizaria a educação em sexualidade. A Oko Press noticiou que o projeto de lei pretende punir qualquer pessoa que “promova o comportamento sexual entre menores”, incluindo médicos que receitam anticoncepcionais, professores que explicam como se proteger contra a gravidez, o HIV e outras ISTs, e qualquer meio de comunicação que aparenta ser voltado para jovens e tenham ver com sexo ou sexualidade. A Oko Press observou que o projeto de lei ‘Acabe com a Pedofilia’ dificilmente será aprovado com seu teor extremo atual. O jornal supõe que a antecipação da votação fez parte da estratégia eleitoral do partido Law and Justice Party’s (PiS) para conquistar católicos ultraconservadores.
O The Guardian noticiou que o Escritório de Estatística da Austrália rejeitou a inclusão de perguntas sobre identidade de gênero e orientação sexual no censo de 2021. Depois de consultas com o público e com especialistas, no ano passado o Escritório identificou oito tópicos, inclusive estes, para o censo. Um porta-voz disse que a decisão foi tomada para minimizar a “sobrecarga” dos respondentes. Houve ativistas que ficaram decepcionados, afirmando que a coleta de dados é fundamental para que sejam destinados recursos governamentais e serviços de saúde suficientes para a comunidade LGBTI+.
Mais sobre o Mundo da política
A política e o casamento: No Japão, o deputado Hakubun Shimomura provocou um rebuliço dentro do seu conservador Partido Democrático Liberal, ao sugerir que a constituição poderia revisada para legalizar o casamento igualitário. O primeiro ministro, Shinzo Abe, pediu para os legisladores avançarem com um “debate sério” sobre a reforma constitucional, apesar de ser improvável que inclua o casamento.
Em junho, o Partido Democrático Constitucional e o Partido Comunista do Japão apresentaram um projeto de lei para instituir o casamento igualitário por meio da adoção de linguagem neutra de gênero. Atualmente, casais do mesmo sexo em alguns municípios podem pedir certidões de parceria, porém são simbólicas e não acarretam direitos.
Mais sobre a política e o casamento
Que os tribunais decidam: Na Rússia, o Tribunal Distrital de Oktyabrsky determinou que a VKontakte, a maior rede social do país, feche dos grupos de apoio online às pessoas LGBTI+. O tribunal afirmou que os grupos estavam postando informações que “refutam os valores familiares, propagam relações sexuais não tradicionais e promovem atitudes desrespeitosas para com os pais”. A AFP noticiou que os grupos tinham mais de 187 mil membros. A lei russa sobre “propaganda gay”, aprovada em 2013, proíbe o compartilhamento de informações sobre “relacionamentos não tradicionais”.
O ativista de Singapura Tan Seng Kee impetrou uma nova ação no Tribunal Superior contestando a Seção 377A do Código Penal—a lei que criminaliza as relações entre pessoas do mesmo sexo. Em 2014, o Tribunal de Apelações determinou que a lei é constitucional, a partir do raciocínio de que a constituição não faz menção de “gênero”, “sexo” ou “orientação sexual” nas proteções contra discriminação. Outras duas ações contestando a lei estão pendentes.
No Paraguai, um tribunal condenou um homem que assassinou uma mulher trans à pena máxima de 25 anos de prisão, segundo reportagem da Reuters. A ativista Mariana Sepúlveda, secretária geral da organização Panambi, de apoio às pessoas trans, disse que foi a primeira condenação dentre mais de 60 casos envolvendo o assassinato de pessoas trans:
“Hoje é um dia histórico, que marca um grande precedente... Esperamos que agora haja alguma mudança.”
O Tribunal de Igualdade da África do Sul decidiu contra o Departamento Penitenciário por ter se recusado a permitir que uma presidiária trans pudesse expressar sua identidade de gênero. Jade September foi detida em uma ala masculina, onde foi sujeita a assédio e obrigada a se apresentar como homem. O juiz determinou que seja permitido que ela expresse o gênero, que possa ser transferida para uma ala feminina, e que os funcionários dos penitenciários recebam treinamento obrigatório de sensibilização sobre pessoas trans.
A Suprema Corte dos EUA ouviu sustentações orais relativas a três ações que podem ter impacto nos direitos trabalhistas das pessoas LGBTI+. No centro das três ações está a seguinte pergunta: a Lei dos Direitos Civis de 1964, que proíbe a “discriminação por sexo” no local de trabalho, inclui a proteção das pessoas com base na orientação sexual e na identidade de gênero? Ativistas, incluindo a atriz Laverne Cox e o advogado Chase Strangio, da ACLU, têm realizado coletivas de imprensa a fim de promover a ampla sensibilização do público utilizando os hashtags #yesimLGBTQ (sim sou LGBTQ) e #RiseUpOct8 (manifeste-se em 8 de outubro).
A Suprema Corte dos EUA está prestes a apreciar uma ação importante sobre os direitos reprodutivos. A ação envolve uma lei estadual da Louisiana que restringe significativamente o acesso ao aborto. Embora seja a primeira ação na Suprema Corte desde que o caso Roe v. Wade legalizou o aborto, em 1973, é improvável que seja a última, visto que especialistas afirmam que parece que várias novas leis estaduais tenham sido “calculadas” para obrigar a Corte a reconsiderar este direito.
Sobre a religião: No Vaticano, o Papa Francisco se reuniu em caráter privado com o reverendo James Martin, autor de “Construindo uma ponte: como a Igreja Católica e a Comunidade LGBT podem entrar em uma relação de respeito, compaixão e sensibilidade”. Martin disse que o Papa Francisco estava “à vontade” para falar sobre a pastoral de Martin junto à comunidade LGBTI+. Descrevendo a reunião como “consoladora, inspiradora e encorajadora”, Martin disse:
“Levei para dentro daquela sala as alegrias, esperanças, lutas e os desafios dos católicos LGBTI+ e das pessoas LGBTI+ do mundo inteiro.”
O UNAIDS convidou mais de 150 líderes religiosos para o Café da Manhã das Comunidades Religiosas, um evento realizado em paralelo à Assembleia Geral da ONU para discutir as experiências de trabalho com a prevenção ao HIV em comunidades. Gunilla Carlsson, diretora executiva interina do UNAIDS, disse que o engajamento das parcerias religiosas da área da saúde é “fundamenal” para ajudar os governos a transformar os compromissos relativos ao HIV em “ações verdadeiras de base”.
Na Coreia do Sul, o grupo Comunitário Cristão Protestante tem liderado vários protestos e manifestações, com milhares de participantes, contra a comunidade LGBTI+. A repórter Laura Bicker entrevistou participantes que afirmaram que a homossexualidade deve acabar e que o “verdadeiro amor está impedindo que [as pessoas LGBTI]+ vão para o inferno”. A Catholic Press of Korea noticiou que sacerdotes protestantes, budistas, won-budistas e católicos se reuniram com a população para discutir a discriminação e a igualdade dentro de suas religiões.
Medo e ódio: Ativistas no Uzbequistão dizem que gangues estão espancando e humilhando homens percebidos como sendo gays, fazendo com que a comunidade LGBTI+ viva com medo de ser entregue. A Reuters noticiou que apesar do governo ter assumido o compromisso de implementar as recomendações da ONU sobre direitos humanos, ele se recusou a descriminalizar as relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo. Steve Swerdlow, pesquisador sênior na Human Rights Watch, observou:
“Está aberta a caça às pessoas LGBTI+ no Uzbequistão, e é de suma importância que o governo dissemine uma mensagem de tolerância.”
Ativistas na Rússia dizem que um grupo de ódio online chamado “Pila” (“Motosserra” em russo, em referência aos filmes de terror com o mesmo nome) vem utilizando as mídias sociais e a internet para incentivar a violência contra as pessoas LGBTI+. Entre suas ameaças, postaram uma lista de nomes de ativistas LGBTI+ com pedidos para assassiná-los. Uma das pessoas na lista, Yelena Grigoryeva, foi esfaqueada oito vezes até morrer, em julho. Embora a opinião seja dividida sobre até que ponto o Pila seja perigoso, o sociólogo Alexander Kondakov observou que a falta de ação na área da segurança pública é um perigo:
“Esta situação terrível incentiva não só o próprio Pila, como também outros como eles—as pessoas percebem que essas ações são impunes.”
Rasha Younes entrevistou 50 mulheres trans libanesas sobre moradia e sobrevivência no país, apesar da violência e da discriminação que enfrentam em todos os aspectos da vida. Maria, uma das mulheres entrevistadas, descreveu abusos por parte da família, dos patrões e da polícia:
“Temos que nos forçar a andar e falar conforme manda a sociedade, simplesmente para não sermos espancadas por quem quer que esteja de mau humor no dia em questão. Temos que sacrificar todo o nosso ser. Não estou tentando provocá-los, simplesmente é quem eu sou."
Ventos de mudança: As mudanças climáticas se tornaram o centro das atenções na Assembleia Geral da ONU, e protestos continuaram depois, em vários lugares do mundo, liderados em parte por jovens ativistas. O UNAIDS refletiu sobre como as emergências climáticas impactam severamente as pessoas vivendo com HIV. Para a revista Advocate, John Casey explorou a relação interligada entre o movimento de HIV e o movimento climático/ambiental desde a década de 1980. Em seu relatório global, o Coletivo de Mulheres e Gênero (Women and Gender Constituency) da Convenção Quadro da ONU sobre Mudança do Clima (UNFCCC) chamou a atenção para os desafios enfrentados por mulheres e meninas LGBTI+ e pessoas não binárias por causa das mudanças ambientais e desastres climáticos. A GLAAD deu destaque ao ensaio escrito pelo embaixador de campus Noah Goodwin “Não existe ‘o planeta b’: por que as mudanças climáticas são uma questão LGBTI+”.
O grupo de defesa de direitos ILGA World lançou uma Treaty Bodies Strategic Litigation Toolkit (Caixa de ferramentas para litigância estratégica junto a órgãos de tratados, na tradução livre para o português) para nortear ativistas LGBTI+ e outros defensores dos direitos humanos na utilização do Sistema ONU para obter justiça em relação a questões relacionadas a orientação sexual, identidade de gênero e expressão de gênero (SOGIE), e para avançar com os direitos das pessoas LGBTI+. A caixa de ferramentas inclui uma coletânea de casos relacionados a questões SOGIE que os comitês de especialistas da ONU (conhecidos como “Órgãos de Tratados”, em função de sua relação com os tratados internacionais sobre direitos humanos) já analisaram e emitiram decisão. A caixa de ferramentas explica como os defensores dos direitos humanos podem apresentar seus casos a estes Órgãos de Tratados. Kseniya Kirichenko, oficial sênior da ILGA World para assuntos de mulheres e advocacy na ONU, explicou que embora tenha sido rara a utilização deste método, no passado, por ativistas LGBTI+ para avançar com os direitos:
“Eu realmente acredito que o litígio estratégico dos Órgãos de Tratados da ONU possa se tornar um espaço para o movimento LGBTI+ global reivindicar nossa voz, exercer nossa criatividade e, por fim, trazer a justiça de volta às nossas comunidades.”
O Parlamento Europeu anunciou que Marielle Franco é uma das finalistas para o Prêmio Sakharov de Liberdade de Pensamento. Política brasileira, bissexual assumida e defensora dos direitos humanos, Franco foi assassinada em março de 2018, e a investigação do caso continua.
Ambiente escolar: O Ministério da Educação de Gana defendeu uma proposta de currículo escolar sobre educação em sexualidade baseado no programa de Educação Abrangente em Sexualidade da UNESCO. Muitos grupos cristãos se opuseram ao currículo, com acusações de que se trata de uma “estratégia ativa” para disseminar a aceitação de pessoas LGBTI+ na África, segundo reportagem da Reuters. O Ministério negou as acusações, acrescentando que há pessoas que estão disseminando desinformação propositalmente, utilizando materiais adultos explícitos que não têm nada a ver com o currículo:
“Embora haja muitas pessoas preocupadas de verdade e com razão, há ainda mais que estão sendo maquiavélicas e intelectualmente desonestas em uma tentativa de distorcer propositadamente (ou talvez por ignorância) o trabalho árduo dos ilustres homens e mulheres ganenses que elaboraram o currículo.”
Para o Morocco World News, Youness Bermime argumenta que o Marrocos precisa de uma alternativa ao “Educação Sexual Halal”—currículo baseado no que o islã estabelece como permissível, o que é o equivalente à educação sexual voltada apenas para a abstinência e somente reconhece as relações sexuais heterossexuais depois do casamento. Bermime relata que, em 2015, o Ministério da Saúde registrou 440 mil casos de infecções sexualmente transmissíveis e a Moroccan Insaf Association estimou que, anualmente, 30 mil mães solteiras deem à luz. Bermime adverte:
“A única chance que resta ao Marrocos para reverter os problemas sociais relacionados ao sexo e que crescem ano a ano, é a implementação de um programa abrangente de educação em sexualidade. Nem a ameaça de prisão e nem a vergonha da sociedade estão impedindo que os jovens experimentem a sexualidade.
A ativista Vithika Yadav deu entrevista para o India Today sobre estar à frente do Love Matters India (O Amor Importa, na tradução livre para o português), um site e grupo global de mídias sociais para falar sobre sexo “com uma atitude aberta, honesta e livre de julgamentos”. O Love Matters foi criado com organizações parceiras na Holanda e se ampliou para a América do Sul, Quênia, China e o Oriente Médio.
A ex-primeira ministra da Nova Zelândia Helen Clark explicou por que é importante para todas as crianças e todos os adultos terem conhecimento sobre comportamentos sexuais seguros. Ela diz que a oposição à educação abrangente em sexualidade é muitas vezes “barulhenta, persistente e difundida” porque os críticos não entendem do que realmente se trata.
Esportes e cultura: No Japão, a esposa do primeiro ministro, Akie Abe, participou de uma cerimônia na qual a União de Clubes de Rúgbi do Japão (JRFU) assinou um memorando de entendimentos com o Rúgbi Gay Internacional (IGR). O IGR realizou seu primeiro torneio na Ásia com times de mais de doze países participando do evento de Tóquio.
O atleta olímpico e medalhista de ouro dos EUA Kerron Clement se assumiu como gay no National Coming Out Day (Dia Nacional do Assumir-se, na tradução livre para o portguguês). Na Dinamarca, o goleiro profissional de hóquei no gelo, Jon Lee-Olsen, se assumiu como gay—um dos poucos jogadores profissionais de hóquei no gelo gays assumidos do mundo. Lee-Olsen comentou que se assumir perante aos integrantes do time melhorou a sua performance no gelo:
“Levou mais do que eu imaginava, mas agora estou preparado para me defender e defender os outros.”
A Mattel lançou uma nova boneca neutra de gênero, “Mundo Criável”, elaborada para não apresentar qualquer estereótipo evidente de gênero. Cada boneca também vem acompanhada de perucas modificáveis e uma variedade de opções de roupas. Para a Time, Eliana Dockterman avaliou as mudanças do pensamento que a juventude dos EUA tem a respeito de gênero (um estudo de 2018 do centro de pesquisas Pew mostrou que 35% daqueles que nasceram após 1996 conhecem colegas que utilizam pronomes neutros de gênero) e como as empresas estão se ajustando.
O novo livro “We Both Laughed in Pleasure: The Selected Diaries of Lou Sullivan 1961-1991” (Nós dois rimos de prazer: os diários selecionados de Lou Sullivan 1961-1991) ilumina a vida de Sullivan como autor, ativista e historiador, também possivelmente o primeiro homem trans gay diagnosticado com aids de que se tem conhecimento—numa época em que poucas pessoas reconheciam a existência de homens trans gays. Escrevendo para o New Yorker, Jeremy Lybarger fez uma matéria sobre o “conversador e doce, informalmente poético, e vorazmente sexual” Sullivan, cujos diários captam “paradoxos emocionantes”:
“Um grande medo meu é que eu morra antes que os profissionais da área de gênero reconheçam que alguém como eu exista, e daí de fato eu não existirei para provar que estão errados.”